segunda-feira, 12 de julho de 2010


Gostaria de falar sobre meu novo livro O CANTO DE ASLAM: uma abordagem do mito na obra de C S Lewis.

No livro, busco relacionar teologia e literatura de fantasia (especificamente, de C S Lewis) a partir da análise do mito como elemento essencial à linguagem religiosa, utilizando a lente da Fenomenologia da Religião.

Abaixo, transcrevo uma parte do prefácio escrito pela Gabriele Greggersen:

“Com clareza e objetividade, o autor percorre o legado lewisiano, tanto obras de ficção quanto teológico-filosóficas, com a meta de investigar o papel do mito em seus escritos e sua vida cristã e acadêmica. [...] Para quem duvida que ainda haja "vida inteligente" no mundo protestante e evangélico, esse livro será uma prova não apenas de que há sim, mas também, que ainda existe muito espaço para as idéias de Lewis produzirem lindos e saborosos frutos para o Reino de Deus. [...] Trata-se, a meu ver, de uma pesquisa primorosa em intertextualidade. Assim, conscientemente ou não, o trabalho também redunda interdisciplinar, já que põe as ciências da religião em diálogo com a literatura e a filosofia, quando trata de questões éticas e metafísicas, por exemplo. [...] Desejo a todos uma ótima leitura e bom proveito desse material realmente "de primeira".”

Gabriele Greggersen
Mestre e Doutora em Filosofia da Educação pela FEUSP (Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo); pós-doutora na área de História das Mentalidades, pelo Instituto de Estudos Avançados (FEUSP), e autora de diversos livros.

Aos interessados, o livro encontra-se à venda nos dois sites abaixo:

http://www.editorareflexao.com.br/index.php

ou

http://www.livrariacultura.com.br/scripts/cultura/busca/busca.asp?palavra=canto+de+aslam&tipo_pesq=titulo&sid=91061384512712589618877660&k5=B9C7634&uid=&limpa=0&parceiro=OJPEXT&x=0&y=0


Abraço!

terça-feira, 4 de maio de 2010

CHAMADOS PARA A GUERRA

Parece estranho que Deus nos queira como guerreiros. Somos, por definição até bíblica, fracos e, por mais firmes que estejamos, pura vaidade.

Parece estranho que pessoas como nós, ainda que alcançados pela graça e amor de Deus, sejam chamadas e contadas como guerreiros para o Senhor. Estranho. O que um Deus soberano e Todo-Poderoso poderia esperar de alguém tão pecador como eu?

Antes de tentar responder, é preciso entender um fato: existe uma guerra ocorrendo. Guerra das trevas contra a luz. Batalha que espelha o choque proveniente do encontro do Reino de Deus contra o império das trevas. No entanto, poucos percebem este fato em nossos dias de festas eclesiásticas. Há uma guerra acontecendo, mas não queremos nos envolver. Afinal, aproximar-se do homem ensangüentado nas ruas de Jericó não é tarefa para nós, ministros da religião. Isso deixamos para o imundo samaritano. Ele que se contamine com os corpos feridos e machucados pela vida. Estamos muito ocupados fazendo a obra de Deus!


Mas, a guerra continua, juntamente com suas vítimas. Seres humanos, esquecidos pela sociedade e pela igreja cristã, perambulam pelas ruas, sem alimento ou abrigo. Crianças morrem às centenas durante as incursões policiais em favelas, ou durante as brigas por território entre facções do tráfico. Doenças, há muito extingüídas ou controladas pela Medicina, são campeãs em solo brasileiro. A Igreja tem respondido às necessidades sociais, mas com muito atraso, e nunca na medida exata que o caos sócio-econômico atual exige. No lugar de levar o pão a quem necessita, muitas igrejas têm vivido um projeto de missão egoísta e ensimesmado, paradoxalmente, construindo templos enormes e luxuosos para homenagear Aquele que disse não habitar em templos feitos por mãos humanas. A estrutura eclesiástica transformou-se em um fim em sí mesma, perdendo de vista, por isso, a vocação samaritana que a igreja deveria possuir.

Além de saber (ou reconhecer) a existência desta guerra, é necessário ser soldado de Cristo. E soldados, em primeiro lugar, precisam agir unidos. Nos tempos antigos, a tática usada para vencer batalhas era a formação de falanges: uma perfeita linha de homens postados com armas e escudos, lado a lado. Com essa formação em unidade, os soldados cuidavam e protegiam uns aos outros. Quando as setas do inimigo buscavam o alvo sempre havia o escudo do soldado ao lado para defender o outro. Agora, já não apenas um companheiro de batalhas, mas um irmão nascido na hora da angústia. Quando um deles era atingido (e isso, às vezes, acontece) os outros cercavam o ferido para que houvesse tempo de cura e restauração. Hoje, isto é muito diferente. Quando um irmão é atingido, verificamos as falhas da sua armadura, zombando da sua inabilidade para a batalha e agradecendo ao Rei o fato de nós não sermos tão pecadores. Esquecemo-nos de que uma das maiores fendas na armadura é criada pelo orgulho, disfarçado por nós como uma espiritualidade mais elevada.


Precisamos nos lembrar também que soldados sempre agem sob uma bandeira que ilustra o caráter do reino no qual servem. E para nós, cristãos, a bandeira que Deus nos oferece é a Graça. Somos chamados por Deus para guerrear usando a Sua graça como arma-escudo-estandarte. No entanto, muitas vezes, a maneira pela qual agimos demonstra que ainda não sabemos de que espírito somos. A Graça de Deus sempre cobre os pecadores. Seus soldados, muitas vezes, querem matá-los. A Graça de Deus sempre busca reconciliação. Seus soldados, em nome de uma santidade não-vivida, buscam separação. A Graça de Deus odeia o pecado e ama e justifica e santifica o pecador. Nós, por demasiadas vezes, invertemos esta ordem.


Precisamos urgentemente resgatarmos esse entendimento de que Deus nos chama à guerra. Charles Colson, escritor cristão, afirmou certa vez que “a preocupação de Jesus não era apenas salvar as pessoas do inferno no mundo vindouro, mas também livrá-las da infernalidade deste mundo presente”. E, por estranho que possa parecer, Deus deseja nos usar como soldados. A mim e a você. E já não é tão estranho. Afinal, nossa fraqueza como soldados é o que garante que o poder do Rei que nos arregimenta será aperfeiçoado através de nós.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

REFLEXÕES SOBRE O REINO DE DEUS


O Reino de Deus anunciado por Jesus possui um caráter duplo. De um lado, o anúncio do Reino implica em evangelizar os pobres, libertar os cativos, curar os enfermos e anunciar o ano aceitável do Senhor, numa clara alusão ao Ano do Jubileu, conforme proposto pelos escritos do AT (ver Lc 4.16-21; Lc 7.18-22; Lv 25). Vale lembrar que a proposta do Jubileu, encarnado na missão do Filho, é outorgada à Igreja cristã que vivencia em sua prática diária o compartilhar característico desse mandamento de Deus. E a conseqüência deste fato é clara: os pobres, citados no evangelho de Lucas de forma abundante, são virtualmente esquecidos em Atos (livro escrito pelo mesmo autor do evangelho lucano). E isso ocorre não por um esquecimento deste tema tão caro a Lucas, mas sim porque, na visão lucana, a presença da igreja na sociedade faz com que não haja mais pobres em seu meio (ver At 2.45; 4.32-35).

Por outro lado, contudo, o anúncio do Reino implica em se afirmar o caráter escatológico da pregação de Jesus (Mt 24.30-31; ver também a parábola das dez virgens em Mt 251.13). Sob esta perspectiva, o Reino já veio, mas ainda virá; somos cidadãos do Reino, mas ainda precisamos pedir que ele venha até nós. Isso significa que a plenitude do Reino de Deus, conquanto se revele paulatinamente na história humana, só se dará quando o Filho do Homem retornar em glória.

Se é assim, então é necessário que duas posturas complementares sejam praticadas pela vida dos cristãos, enquanto representantes e cidadãos desse Reino. Em primeiro lugar, precisamos anunciar o Reino na história, isto é, proclamar que a presença de Cristo e de seus embaixadores (II Co 5.20) produz e deve produzir mudanças históricas, mensuráveis por instrumentais sociológicos, políticos, econômicos e culturais. Libertação e salvação devem ser compreendidas de forma integral. Não é atitude cristã proclamar salvação da alma sem se importar com a miséria do corpo.

Em segundo lugar, precisamos proclamar a história no Reino, isto é, devemos reconhecer que é a esperança pela parusía o que move a igreja em sua missão no mundo. Somos peregrinos, e apesar de estarmos no mundo, não pertencemos mais a ele (Jo 17.14-16, 18). Antes, somos vocacionados à eternidade que se inicia no hoje, mas se plenifica na casa do Pai (Jo 14.2-3). Na verdade, a força das teologias elaboradas pelas igrejas vem desta esperança. Esquecê-la faz de qualquer teologia uma atividade sem substância ou relevância na história. Ou ainda, nas palavras de Hugo Assmann, “não há construção perfeita do Reino na história, porque ele é o horizonte que nos esquenta a esperança”. Assim, o Reino que já está presente entre os cristãos é a semente que, ao morrer, dá muito fruto.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Teologia Acadêmica e Teologia Prática... Rivais ou aliadas?

Em ambientes eclesiásticos, existe uma tendência crescente em se separar o pensamento teológico da prática cristã no mundo.

De um lado, permanecem os “teóricos”, cuja principal missão seria salvaguardar o conhecimento teológico desenvolvido pela tradição cristã durante os vários séculos da Igreja; enfatiza-se o academicismo (às vezes, exagerado) que tem sua própria linguagem e postura. De outro lado, surgem os “práticos”, cuja principal característica seria a não dependência de teorias “frias e paralisantes”, que, segundo se afirma, seriam verdadeiros empecilhos à evangelização do mundo. Ambos os grupos trocam mútuas acusações, enquanto, pretensiosamente, apresentam-se como defensores da “fé pura neo-testamentária”.

Será que não é possível estabelecer um meio termo entre essas duas posturas antagônicas? Para John Wesley, por exemplo, entre o ministério prático e a teologia acadêmica precisa haver uma relação geradora de vida. Não basta apenas conhecer os dogmas cristãos; é preciso também vivê-los! Em outras palavras, é necessário percorrer um caminho teológico bem definido, a saber: 1) aprender a teologia (isto é, ouvir o que já foi proposto anteriormente); 2) fazer teologia (questionar o que foi ouvido à luz das necessidades atuais); e, 3) em celebração, viver a teologia (isto é, praticar a teologia de maneira a inseri-la no cotidiano da comunidade).

Este processo exige do teólogo o encarnar-se em sua própria cultura, não permitindo que sua linguagem, escondida numa alta torre e isolada do mundo lá fora, sirva apenas para a elaboração de dogmas complexos que, na verdade, nada têm a dizer aos seres humanos concretos que existencialmente experimentam a vida. Em outras palavras, é necessário desenvolver a consciência de que a teologia só tem sentido se responder às questões de nossas comunidades de fé. Como disse Lutero, “o teólogo se faz vivendo!”.

Por outro lado, não se deve negar a necessidade dos dogmas cristãos nem da teologia que os sustenta e desenvolve. Dogmas teológicos são, nas palavras de Paul Tillich, a expressão de uma “realidade específica, a realidade da igreja”. Isso quer dizer que os dogmas sinalizam (ou, ao menos, deveriam sinalizar) a vitalidade da igreja em sua relação com o mundo que a cerca. Os dogmas tratam, na verdade, de “expressões profundas e maravilhosas da verdadeira vida da igreja”,que relacionam sua piedade, devoção e crenças. São, portanto, vivos em sua dimensão dupla de teoria e praxis.

Somente assim, a teologia cristã pode servir (diaconia) ao mundo que a cerca, ao mesmo tempo em que anuncia a chegada do Reino de Deus. Perguntas sem respostas geram ressentimentos naqueles que as fazem. Se a Igreja não sabe dialogar com a cultura na qual está inserida, e nem responder a seus questionamentos, como poderá anunciar o amor de Deus aos homens? Vale lembrar que os primeiros cristãos não eram motivados em sua missão pela necessidade de se “elaborar conceitos teológicos”; seus escritos eram circunstanciais, e, como tal, respondiam às reais necessidades dos seus ouvintes.

Quando a Igreja encarna sua missão dessa maneira – aliás, esta é a maneira de Cristo! – a resposta dos ouvintes da mensagem é positiva: “O que faremos?” (At 2.37). Em outras palavras, diante da mensagem de Jesus como aquele em quem a profecia do Messias se cumpre e aquele em quem a esperança das pessoas repousa, como devemos agir? Ora, essa é a resposta que a evangelização integral deve encontrar. E esta também é a resposta que uma teologia, que integra em sua vivência a teoria e a praxis, irá gerar.

Ainda que haja muita discussão sobre a Eucaristia (discussões válidas,com certeza), o fato é que Cristo instituiu seu memorial com coisas simples – o pão e o vinho – extraídas do cotidiano de seus ouvintes. Nada mais longe de seu Espírito do que separar tais elementos da vida pela teorização acerca deles; e nada mais longe da Sua vontade do que impedir que os cristãos, sejam estes teológos profissionais ou não, pensem sobre eles. Pensar e agir, portanto, são faces da mesma moeda e não devem nunca ser separados um do outro.

Soli Deo Gloria.

Jesus: messias-guerreiro ou messias-pastor?

A tradição messiânica no interior do Judaísmo sempre esteve ligada à ascenção de Davi como rei. Esta história foi sendo lida a partir de dois pontos de vista distintos: um, é a tradição que surge do campo, relacionada a imagem de um Davi pastor, que vence os seus inimigos pela confiança em Javé, e não pela própria força. Outro, é a tradição palaciana, na qual a monarquia já está estabelecida, e Davi é encarado muito mais como um guerreiro, um rei-militar, que anexa territórios ao reino de Israel pela força de seus exércitos.

Com chegada de Davi ao trono, o termo messias (maschiach, no hebraico) passou a se referir exclusivamente ao Rei. Na verdade, a presença da Arca de Deus em Jerusalém serve para qualificar o Reinado de Davi como autêntico e aprovado por Javé. De um jovem pastor, inexperiente, Davi passou a ser visto como rei, poderoso e forte. Esta será a imagem do Messias que, para todos os efeitos práticos, vigora na época de Jesus.

Isso importa porque, a partir destas imagens, surgiram no interior do Judaísmo duas tradições mssiânicas. Primeiro, temos um Messias Militar, com um caráter fortemente bélico. Trata-se de um messias que vem para reinar e devolver a Israel a glória da monarquia, livre de opressores estrangeiros. Esta expectativa está presente em diversos salmos. O SALMO 2, por exemplo, apresenta determinadas características relativas a este tipo de messianismo. Primeiro, o salmista deixa claro que tipo de relação deve existir entre o messias e os povos: estes devem obediência e submissão àquele. O fato, por exemplo, do Salmo 2 possuir como contexto a cerimônia da entronização do Rei, é um indício de sua utilização como elemento repressor de motins contra seu Reinado. A conseqüência disso, em segundo lugar, é que existe uma relação íntima entre o messias e o próprio Javé. A partir dessa constatação, o salmos lido compreende que quaisquer tentativas de afrontar ao messias são, na verdade, tentativas de insurreição contra Javé. Tal relação fornece ao messias-rei uma posição de autoridade que não poderia, em princípio, ser questionada.

Esta noção aparece também em textos apócrifos. Um trecho dos Salmos de Salomão pede a Deus:

“Desperta-lhes um rei, o filho de Davi (...) cinge-o com o teu poder de modo que aniquile os tiranos ímpios e purifique a Jerusalém dos pagãos que a mancham com seus pés (...) Então ele reunirá um povo santo que ele governará com eqüidade, e julgará as tribos do povo santificado pelo Senhor seu Deus, e dividirá entre eles o país, e os estrangeiros não terão o direito de habitar no meio deles (...) O Rei [MESSIAS] tornará Jerusalém pura e santa como era no começo!”

A outra tradição messiânica surge do campo, e está relacionada à figura de um messias pastor. O profeta Isaías (Is 6.1 – 9.7 e Is 11.1-9), o profeta Miquéias (Mq5.2-5) e o profeta Zacarias (Zc 9.9-10) defendem esta tradição. Há, nesses textos, uma ruptura com a imagem do Messias proposto pela monarquia. O reinado do Messias não será pela força (bélico), mas sim pela paz: trata-se, aliás, de um Messias-menino que trará um reino de paz, justiça e direito (Is 9.6-7). O messias-menino marca o início de um novo tempo para Judá. Além disso, o messias-menino será guiado pelo Espírito de Javé, de sabedoria e inteligência, e não pelo poderio militar (Is 11.1-6).
Miquéias também compreende assim a vinda do Messias, incorporando outra imagem importante: o messias que vem é um pastor, isto é, aquele que cuida, apascenta, alimenta e protege suas ovelhas. Longe de ser um messias militar, que governará pela força, o messias esperado por Miquéias governará pela força de Javé, e esta atuação pastoral trará paz à terra. (Mq 5.2-5)

Zacarias,por sua vez, reproduz essas expectativas, falando da vinda de um Messias pobre, que vem como fonte de liberdade e alegria (Zc 9.9-10). O Messias de Zacarias é justo – sua justiça é evidenciada no cuidado com os pobres. O Messias é pobre (humilde), pois é aquele que revela que Deus assume a defesa dos oprimidos para libertá-los.

E quanto a Jesus? Que tipo de Messias os escritores do NT apresentam em suas páginas? E o próprio Senhor? Com qual tradição messiânica ele se identificava?

Para os evangelistas, o Cristo que veio está relacionado a esta tradição de um messias pastor. Mateus relê Isaías e Zacarias, aplicando o teor de suas profecias a Jesus (Mt 1.18-25; 21.1-11). Já João apresenta a função do Messias no Novo Testamento como pastoreio: Jesus é o bom pastor, que cuida e dá a sua vida pelas suas ovelhas (Jo 10).

Jesus também escolheu esta tradição. Percebendo que o título Messias trazia para os judeus conotações políticas – isto é, o Messias, pela força, libertaria Israel do poderio de Roma – Jesus decide, conscientemente, rejeitar qualquer proposta nesse sentido. Na tentação do deserto, por exemplo, a possibilidade de tornar-se este messias militar é enfaticamente recusada. A oferta de Satanás (“Se me adorares, tudo isto será teu”) continha exatamente a expectativa que o Judaísmo esperava do Messias: “ter a glória dos reinos” (Mt 4.8-10). Em outras palavras, era a tentação de assumir este papel político de conquista pela força. Jesus recusa veementemente este título de Messias como líder político revolucionário. Ele decide ser um messias mais humano!

Falar de um Messias aparentemente fraco – e, conseqüentemente, de uma comunidade que o segue – incomoda muitos que não conseguem aceitar a idéia de um Messias pastor. Mas é justamente essa figura que mais se aproxima do ministério de Jesus. Ele cuida de suas ovelhas, e mais: as conhece pelo nome. Ele as enxerga como pessoas que estão cansadas, sobrecarregadas e oprimidas, e a elas, Ele oferece seu fardo que é leve e suave.
Resta saber se nós, seus discípulos, também escolheremos esta tradição.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

NOSSA TEOLOGIA É VÁLIDA?

Nossa teologia é válida?

Dizendo melhor: nossa teologia, isto é, aquilo que sustenta nossas práticas cristãs, é pertinente? Diz respeito ao nosso mundo, às nossas realidades pessoais, aos homens e mulheres que nos cercam?


Faço-me essa pergunta hoje porque percebo que muito do se ouve em orações e sermões eclesiásticos – alguns, eu mesmo os faço! – não possui qualquer sentido para os que os escutam. Não dizem nada aos que sofrem. Não acrescentam consolo aos enlutados. Não reafirmam a esperança cristã aos oprimidos. São orações e pregações sem sangue e vísceras; simplesmente, não têm chão. Justamente por isso, não servem pra nada. São fruto de uma teologia fria, distante, sem cheiro nem sabor. Teologia que não serve aos que sofrem numa unidade de tratamento intensivo em algum hospital da Baixada; que não presta para os favelados que se alimentam de ratos sujos, e que não têm acesso a uma vida digna. Vida? Sobrevida, talvez...

Além de não falar ao próximo, tal teologia também não diz nada a Deus. Na verdade, creio que o Eterno está cansado de ouvi-la, exausto de vê-la sendo usada como arma contra o outro. Afinal, dogmas teológicos são companheiros íntimos da intolerância e da falta de amor. Não respiram em ambientes plurais, nem aceitam o discurso diferente. Não conseguem reconhecer como irmãos aqueles que, embora não sigam os discípulos, pregam o Reino em nome do Cristo. Dogmáticos e suas ortodoxias são os substitutos para Deus, assumindo-se como únicos representantes do Sagrado; são monopolizadores da fé; rígidos em suas posições doutrinárias, incapazes de enxergar a sabedoria divina que é, por definição, multiforme e multicolorida.

E Deus, imagino, se questiona porque essas crianças tolas não se calam e aproveitam a vida.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Por que "Caminho no deserto"?

Por que um nome como "Um caminho no deserto"? O correto não seria fazer referência àquele que está no deserto, proclamando?

Ocorre que há um problema nas traduções que fazem referência a João Batista e sua pregação no deserto. O texto, na grande maioria de nossas versões, afirma: "Voz do que clama no deserto: preparai o caminho do Senhor" (Mt 3.3). Traduz a idéia de que o pregador está no deserto, e, de lá, proclama a sua mensagem. Os autores do NT logo associaram (não sem razão) este personagem citado por Isaías ao profeta João Batista. Ele é o que surge no deserto, conclamando o povo ao arrependimento devido à chegada do Reino de Deus.

Porém, os evangelistas utilizaram como fonte para seus escritos a Septuaginta (LXX), isto é, a versão do AT em grego. O ponto em questão é que a LXX traduziu de forma incorreta o texto hebraico de Isaías 40.3. Na verdade, na bíblia hebraica, o verso se lê da seguinte maneira: "Voz do que clama: no deserto preparai o caminho do Senhor".

Dessa forma, é o caminho de Deus que está sendo preparado no deserto. Aliás, isso condiz com o ministério de João Batista e do próprio Jesus: suas críticas às elites religiosas e políticas de seu tempo revelam que Deus não se associa aos centros de poder humanos. Antes, o caminho de Deus é feito no ermo, na periferia, entre os excluídos da sociedade, entre os que não têm voz nem vez na ótica destas elites.

Se é assim, então vale a pena questionar a prática evangélica que é praticada em nossas comunidades de fé. Desejamos estar com Deus, no deserto, ou preferimos nos aliar ao poder que busca monopolizar o acesso ao Sagrado? Nosso caminho segue a prática ministerial de Jesus, ou tem seus próprios interesses e desejos?

Que cada um responda.

Quanto a mim, prefiro buscar o deserto.


Soli Deo Gloria